segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

HUMOR "NEGRO"… - coisas do politicamente (in)correcto

Ele é sabido que o pessoal dos comunistas nunca teve grande sentido de humor... E quando tentam ter, sai-lhes o tiro pela culatra.
Atão num é que o sindicalista Arménio Carlos escorregou numa casca de banana e caíu nessa coisa do politicamente incorrecto, ao falar no "escurinho" do FMI? - Claro que a piadola ficava muito mais subtil e inteligente, se ao fazer a comparação dos troikos com os reis magos, mencionasse apenas o BCE (Banco Central Europeu), o CE (Conselho Europeu) e o do FMI... Logo toda a gente percebia qual era o 3º rei mago (sem que houvesse confusão com o "nosso" rei Gaspar, pois este também sendo mago não era "escurinho", pelo que não encaixava nos 3, se bem que com eles "emperne"). A comparação era perfeita, a piada era fininha e ninguém se chateava! (quando muito um riso amarelo, ehehe)
Agora assim, as virgens púdicas do "politicamente correcto" estragaram o "sound bite" e trataram logo de desviar a atenção do essencial: que esses senhores são, de facto, os três reis magos da nossa miséria e "não tenho dúvidas e raramente me engano" (como alguém dizia) que não estão cá para nos "salvar": estão cá é para garantir que pagamos com língua de palmo o que se deve ao grande Capital financeiro internacional, e sermos a vaca que eles vão tentar mugir "ad aeternum"... - Sim, porque a troika é um exército de ocupação (ao serviço de alguém que não é o menino Jesus) e nunca nenhum exército de ocupação saíu de livre vontade e de mãos a abanar de territórios ocupados/conquistados....

Aqui fica o "fait divers" - entretenham-se:

«CGTP A gaffe de Arménio sobre o rei mago "escurinho" da troika
No discurso que fez no final da manifestação de professores, no sábado na Praça do Rossio em Lisboa, o secretário-geral da CGTP, Arménio Carlos, fez uma ‘infeliz’ analogia entre a troika e os Reis Magos, referindo-se a Abebe Selassie como o “mais escurinho”. A polémica instalou-se depois nas redes sociais e até mereceu uma nota do professor Marcelo Rebelo de Sousa.»   [- olha se este não aproveitava também para molhar a sopa na sua tele-missa... - mas também se podia dizer qualquer  coisita sobre a comparação que fez entre António José Seguro e o António Costa, como se fossem um televisor a Preto e Branco e um televisor a cores - qual é qual, ó sr. prof. Marcelo??? poix, poix... malandreco, mas mais fino que o Arménio.... é o que se chama um "macaco de rabo pelado", como ele já disse de si próprio....]

Para saber mais, clicar sobre este link:
http://www.noticiasaominuto.com/politica/40233/a-gaffe-de-arm%c3%a9nio-sobre-o-rei-mago-escurinho-da-troika

ACTUALIZAÇÃO:
http://www.noticiasaominuto.com/politica/40431/jo%c3%a3o-soares-sai-em-defesa-de-arm%c3%a9nio-o-et%c3%adope-%c3%a9-mesmo-escurinho

domingo, 27 de janeiro de 2013

DIZ QUE... vai haver nova Manif. lá para dia 2/03...


Como é domingo, fumos à praça cá d'aldeia, e encontrámos colado no pelourinho mais um escrito com os dizeres que vão ao abaixo e que por ser berdade o que diz, aqui vo-lo deixamos e pensai em reclamar outra vez com esses troikos, lá pr'ó dia 2 de Março, a ber se nos oubem - que isto assim num pode cuntinuar, meus amigos!
A todos os Portugueses
Em Setembro, Outubro e Novembro de 2012 enchemos as ruas mostrando claramente que o povo está contra as medidas austeritárias e destruidoras impostas pelo governo e seus aliados do Fundo Monetário Internacional, da Comissão Europeia e do Banco Central Europeu – a troika.
Derrotadas as alterações à TSU, logo apareceram novas medidas ainda mais gravosas. O OE para 2013 e as novas propostas do FMI, congeminadas com o governo, disparam certeiramente contra os direitos do trabalho, contra os serviços públicos, contra a escola pública e o Serviço Nacional de Saúde, contra a Cultura, contra tudo o que é nosso por direito e acertam no coração de cada um e cada uma de nós. Por todo o lado, crescem o desemprego e a precariedade, a emigração, as privatizações selvagens, a venda a saldo de empresas públicas, enquanto se reduz o custo do trabalho.

Não aguentamos mais o roubo e a agressão.

Indignamo-nos com o desfalque nas reformas, com a ameaça de despedimento, com cada posto de trabalho destruído. Indignamo-nos com o encerramento das mercearias, dos restaurantes, das lojas e dos cafés dos nossos bairros. Indignamo-nos com a Junta de Freguesia que desaparece, com o centro de saúde que fecha, com a maternidade que encerra, com as escolas cada vez mais pobres e degradadas. Indignamo-nos com o aparecimento de novos impostos, disfarçados em taxas, portagens, propinas… Indignamo-nos quando os que geriram mal o que é nosso decidem privatizar bens que são de todos – águas, mares, praias, território – ou equipamentos para cuja construção contribuímos ao longo de anos – rede eléctrica, aeroportos, hospitais, correios. Indignamo-nos com a degradação diária da nossa qualidade de vida. Indignamo-nos com os aumentos do pão e do leite, da água, da electricidade e do gás, dos transportes públicos. Revolta-nos saber de mais um amigo que se vê obrigado a partir, de mais uma família que perdeu a sua casa, de mais uma criança com fome. Revolta-nos o aumento da discriminação e do racismo. Revolta-nos saber que mais um cidadão desistiu da vida.

Tudo isto é a troika: um governo não eleito que decide sobre o nosso presente condicionando o nosso futuro. A troika condena os sonhos à morte, o futuro ao medo, a vida à sobrevivência. Os seus objectivos são bem claros: aumentar a nossa dívida, empobrecer a maioria e enriquecer uma minoria, aniquilar a economia, reduzir os salários e os direitos, destruir o estado social e a soberania. O sucesso dos seus objectivos depende da nossa miséria. Se com a destruição do estado social a troika garante o financiamento da dívida e, por conseguinte, os seus lucros, com a destruição da economia garante um país continuamente dependente e endividado.

A 25 de Fevereiro os dirigentes da troika, em conluio com o governo, iniciarão um novo período de avaliação do nosso país. Para isto precisam da nossa colaboração e isso é o que não lhes daremos. Porque não acreditamos no falso argumento de que se nos “portarmos bem” os mercados serão generosos. Recusamos colaborar com a troika, com o FMI, com um governo que só serve os interesses dos que passaram a pagar menos pelo trabalho, dos bancos e dos banqueiros, da ditadura financeira dos mercados internacionais. E resistimos. Resistimos porque esta é a única forma de preservarmos a dignidade e a vida. Resistimos porque sabemos que há alternativas e porque sabemos que aquilo que nos apresentam como inevitável é na verdade inviável e por isso inaceitável. Resistimos porque acreditamos na construção de uma sociedade mais justa.

A esta onda que tudo destrói vamos opor a onda gigante da nossa indignação e no dia
2 de Março encheremos de novo as ruas. Exigimos a demissão do governo e que o povo seja chamado a decidir a sua vida.

Unidos como nunca, diremos basta

A todos os cidadãos e cidadãs, com e sem partido, com e sem emprego, com e sem esperança, apelamos a que se juntem a nós. A todas as organizações políticas e militares, movimentos cívicos, sindicatos, partidos, colectividades, grupos informais, apelamos a que se juntem a nós. De norte a sul do país, nas ilhas, no estrangeiro, tomemos as ruas!

QUE SE LIXE A TROIKA. O POVO É QUEM MAIS ORDENA!

ADENDA: A manifestação de 2 de Março será pacífica. As armas que levamos são as nossas vozes e a nossa presença. Não serão, pois, bem vindos ao protesto ou à página quaisquer apelos à violência. Demarcamo-nos por isso de comentários notoriamente racistas, xenófobos ou fascistas assim como de perfis com o propósito de insultar os participantes.

De Maria do Rosário Gama (APRe! - Aposentados, Pensionistas e Reformados)

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Ele há coisas que não mudam...

Ainda a propósito da Concentração dos Amigos de 31 de Janeiro (post anterior), veio-nos à lembradura um escrito de um home cá das nossas bandas, um tal de Abílio, nome de Guerra: Junqueiro, em que azougava cá este Pôbo que aguentava tudo sem o arreganho de um couce... Foi isso em 1896, pouco depois do 31 do Porto. - Bem, a resposta teve-a poucos anos depois, quando dois mais estreloucados mataram o rei (e um era trasmontano!!) em Lisboa,  e logo a seguir mandaram abaixo a monarquia e puseram a república. Mais de um séc'lo aos depois, há coisas que parece que não mudam. Atão aqui vai:

"Um povo imbecilizado e resignado,
humilde e macambúzio,
fatalista e sonâmbulo,
burro de carga,
besta de nora,
aguentando pauladas,
sacos de vergonhas,
feixes de misérias,
sem uma rebelião,
um mostrar de dentes,
a energia dum coice,
pois que nem já com as orelhas
é capaz de sacudir as moscas;
um povo em catalepsia ambulante,
não se lembrando nem donde vem,
nem onde está,
nem para onde vai;
um povo, enfim,
que eu adoro,
porque sofre e é bom,
e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso
da alma nacional,
reflexo de astro em silêncio escuro
de lagoa morta (...) Uma burguesia,
cívica e politicamente corrupta ate à medula, não descriminando já o bem do mal,
sem palavras,
sem vergonha,
sem carácter,
havendo homens
que, honrados (?) na vida íntima,
descambam na vida pública
em pantomineiros e sevandijas,
capazes de toda a veniaga e toda a infâmia,
da mentira à falsificação,
da violência ao roubo,
donde provém que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral,
escândalos monstruosos,
absolutamente inverosímeis no Limoeiro (...)

Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo;
este criado de quarto do moderador;
e este, finalmente, tornado absoluto
pela abdicação unânime do país,
e exercido ao acaso da herança,
pelo primeiro que sai dum ventre
- como da roda duma lotaria.
A justiça ao arbítrio da Política,
torcendo-lhe a vara
ao ponto de fazer dela saca-rolhas; Dois partidos (...),
sem ideias,
sem planos,
sem convicções,
incapazes (...)
vivendo ambos do mesmo utilitarismo
céptico e pervertido, análogos nas palavras,
idênticos nos actos,
iguais um ao outro
como duas metades do mesmo zero,
e não se amalgamando e fundindo, apesar disso,

pela razão que alguém deu no parlamento,
de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar (...)"


Guerra Junqueiro, in "Pátria", 1896.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Manifesto do Porto-31 de Janeiro, em prol da "Res Publica"!

Um grupo de cidadãos do Porto e do Norte de Portugal subscreveu um  manifesto em defesa da República e da Democracia, agendando uma concentração para o dia 31 de Janeiro junto da igreja de Santo Ildefonso, ao cimo da rua 31 de janeiro. Como é sabido, nessa data e no ano de 1891, houve aqui uma tentativa de implantação da República a partir da cidade do Porto, no seguimento do grande descontentamento gerado pelo ultimato inglês a Portugal por causa do chamado "mapa cor-de-rosa", mas também por causa da situação geral do país, cujos males se atribuíam à monarquia. Hoje, as problemáticas são outras, mas é igualmente enorme o mal estar geral, quando os "ultimatos" vêm de outras proveniências. Assim, aqui anunciamos pela  nossa Aldeia que é preciso descer à Cidade e subir a rua 31 de janeiro, no dia... 31!

Aqui fica o Manifesto e os primeiros subscritores:


Em defesa da república e da democracia
O último relatório do FMI, encomendado pelo governo de Passos Coelho, é uma brutal declaração de guerra à nossa economia e aos direitos dos cidadãos. Sob a capa de um estudo técnico, trata-se de uma inaceitável ingerência estrangeira, que pretende determinar o futuro de Portugal, enfraquecer a República e a democracia, rasgar a Constituição, agravar a precariedade, o desemprego, a miséria e as desigualdades sociais. É mais um episódio da tragédia a que a troika e o governo querem sujeitar o país, numa via de dependência e ruína, atirando um número crescente de portugueses para situações de pobreza mendicante, de perda de esperança e de medo do futuro. 
Portugal já enfrentou outras crises e ultimatos de potências estrangeiras, que tiveram sempre cumplicidades internas,mas que conheceram também a resistência popular e patriótica. Nesta data, vale a pena recordar a revolta republicana do Porto de 31 de Janeiro de 1891 e todos aqueles que se bateram contra o ultimato inglês e contra o regime que aceitou um outro «memorando», numa conjuntura de bancarrota nacional, gerada pela incompetência dos governos da época.
Insubmisso à ditadura, o Porto transformou o 31 de Janeiro em símbolo vivo de resistência e de combate pela democracia. 
No momento em que o Estado social e os valores da democracia e da solidariedade estão a ser alvo de uma guerra económica, social e cultural, alimentada pela ditadura dos mercados financeiros e pela cartilha neo liberal, centralista e retrógrada do governo de Passos Coelho, a evocação da memória do 31 de Janeiro exige um novo compromisso cívico em defesa da República e da democracia.

Viva Portugal! Viva a República!
Porto, 31 de Janeiro de 2013

Concentração
31 de janeiro de 2013, pelas 18h30, igreja de Santo Ildefonso, Porto

Subscritores:
Albano Vasconcelos, jurista, Porto
Alice Fátima Cardoso Alves, professora do Ensino
Secundário, Artes Visuais, reformada
Alice Semedo, professora, FLUP
Amândio Jorge Morais Barros, professor do ensino superior/investigador
Amélia Lopes, professora FPCEUP
Ana Luísa Amaral, poeta
Ana Maria Pinto, cantora lírica
Ana Paula Canotilho, professor do Ensino Básico eSecundário
António F. M. Baldaia, professor do Ensino Básico e dirigente sindical
Ariana Cosme, professora FPCEUP
Alexandra Sá Costa, professora FPCEUP
Augusto Rogério Leitão, professor Univ. Coimbra, aposentado
Berta Granja, professora Instituto Superior Serviço Social do Porto
Carlinda Leite, professora FPCEUP
Carlos J. G. Pimenta, economista
Carlota Maria Fernandes dos Santos, professora Univ.
do Minho
Catarina Paiva, gestora de perecíveis
Catarina Silva Martins, professora/investigadora
FBAUP/i2ADS
Cristina Rocha, docente
Deolinda Araújo, professora ESE-IPP
Diogo Canotilho,
Dulce Magalhães, socióloga/professora do ensino superior
Duarte Canotilho, Porto
Elisabete Ferreira, professora FPCEUP
Estela Gomes, professora
Fátima Pereira, professora FPCEUP
Fernando José Pereira, artista plástico, professor FBAUP
Francisco Gil Silva, historiador, Porto
Gaspar Martins Pereira, historiador/professor Faculdade de Letras U.Porto
Germano Silva, jornalista
Henrique João Carneiro Borges, professor e dirigente sindical
Inês Barbedo Maia, direcção de produção
João Caramelo, professor FPCEUP
Jaime Mota, pianista
João Teixeira Lopes, sociólogo, prof. do ensino superior
Joaquim Antero Romero Magalhães, prof. catedrático jubilado da Univ. de Coimbra
Jorge Aragão Tavares Fonseca, professor do ensino secundário
Jorge Magalhães, administrativo e dirigente sindicaldo CESP
Jorge Moreira, técnico de Servio Social
José Alberto Correia, professor, FPCEUP
José Carlos de Paiva, artista/professor/investigador na FBAUP/i2ADS
José Alexandre Roseira, viticultor
José Soeiro, sociólogo, do Porto
José Vaz, escritor
Leonel Cosme, escritor
Luís Miguel Duarte, historiador/professor catedrático Faculdade de Letras U. Porto
Luís Fernandes, professor FPCEUP
Luís Loureiro Tavares, engenheiro, Porto
Madalena Lima, desempregada
Madalena Paiva Brandão, reformada
Manuel Matos, professor FPCEUP, jubilado
Manuela Mendonça, professora, dirigente sindical
Manuela Matos Monteiro, Porto
Manuela Ribeiro, psicóloga, técnica superior de Reinserção Social
Manuela Terrasêca, professora FPCEUP
Margarida Reis, cantora lírica, professora do Conservatório de Música do Porto
Mª Adélia Francês Rodrigues Aresta, técnica serviço social
Mª Céu Moreira, técnica serviço social
Mª Fernanda Correia, investigadora aposentada
Maria Fernanda Teles, economista
Maria Fernanda Torres, Porto
Maria Glória Vieira da Silva, pré-reformada
Maria João de Abreu Mena Guimarães e Castro, professora do Ensino Superior
Maria Natália Faria Oliveira, economista
Maria Otília Pereira Lage, bibliotecária/professora
Marianne Lacomblez, professora FPCEUP
Mário Brochado Coelho, advogado
Mário Sales de Carvalho, Movimento de Cidadãos em Defesa da Linha do Tua
Marlene Cruz, arquivista/bolseira de investigação
Michelle Domingos, professora precária que deseja ser professora-não-precária
Mónica Faria, investigadora na FBAUP/i2ADS
Natália Fauvrelle, museóloga
Natércia Alves Pacheco, professora (jubilada) FPCEUP
Nelson Campos Rebanda, arqueólogo
Nuno Luís Caçote da Silva, pianista/professor de piano
Olívia Marques Silva, professora do ensino superior
Paulo Pereira, docente/designer
Paulo Renato Cardoso Ricardo, técnico de laboratório.membro do Conselho Nacional da CGTP
Pedro Abrunhosa Pereira, arqueólogo
Pedro Oliveira, professor, ICBAS, Universidade do Porto
Teresa Medina, professora na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da U. Porto
Renato Soeiro, engenheiro civil, Porto
Rogério Paulo Sousa, investigador/professor universitário
Rosa Lídia Sousa, professora do Ensino Secundário
Rita Raínho, professora M_EIA, Cabo Verde
Rui Cavadas Costa, designer
Rui Trindade, professor FPCEUP
Samuel Guimarães, professor/trabalhador da cultura
Sara Daniela Dantas Caldeira, estudante
Simão Mata, psicólogo
Soares Luz, dirigente associativo
Susana Medina, museóloga
Tiago Barbedo Assis, docente na FBAUP
Vítor Martins, professor na FBAUP


quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

SILÊNCIOS - ainda sobre o medo de existir...

Ainda no seguimento do post anterior e ainda sobre os "silêncios que ignoramos" até um dia (cada vez mais breve) poder chegar o nosso dia, aqui deixamos algo muito oportuno que corre pela net, de autoria de J. Nunes de Almeida (da Ericeira) e que nos foi enviado por um amigo: :

"Um dia bateram-me à porta e anunciaram-me que o governo tinha decidido cortar-me meio subsídio de Natal. Apesar de inconstitucional, compreendi o sacrifício que o Governo me pedia.
Noutro dia bateram à porta do meu pai e anunciaram-lhe que iam cortar meia pensão do Natal. Apesar de considerar que era um roubo, ainda admiti, porque o país estava em estado de emergência.
Depois bateram-me à porta e anunciaram que me iam tirar dois meses de salário e dois meses de pensão ao meu pai. Depois da estupefacção, resignação.
A 7 de Setembro, bateram-me à porta para me anunciar que tiravam 7% do salário para dar 5,75% ao patrão e ficavam com os trocos, em princípio para os cofres da Segurança Social. Desta vez fiquei indignado. Achei que estava a ser roubado e que estavam a transformar os patrões em receptadores do dinheiro roubado. Em reacção, corri para a rua para protestar.
Bateram-me mais uma vez à porta e informaram-me de que o ministro das finanças ia reescalonar as taxas de IRS, de modo a torná-lo mais progressivo.
Imaginando que iam poupar os rendimentos mais baixos e taxar fortemente os mais altos, pensei que o Governo, finalmente, voltava ao trilho da lei.
Mas para surpresa minha, voltaram a bater-me à porta para me ameaçarem com aumentos brutais no IMI. A minha indignação transformou-se em ira e juntei-me ao movimento nacional de resistentes ao pagamento do IMI.
Ainda mal refeito do choque do IMI, bateram-me novamente à porta para me mostrarem nos jornais, em grandes parangonas e cinco colunas, os novos escalões de IRS. Afinal aumentaram as taxas dos rendimentos mais baixos, menos os dos mais altos e não criaram nenhum escalão para os mais ricos. E a progressividade do rei dos impostos diminuiu. A minha raiva subiu de tom e resolvi não mais voltar a votar e estou preparado para qualquer acção revolucionária que apareça.
Ao fim e ao cabo eu, o meu pai e a minha família já não temos nada a perder".
(J. Nunes de Almeida, Ericeira)
 
***
 
O escrito de Nunes de Almeida inspira-se certamente em outros avisos, de autores célebres, adaptados cada qual ao seu tempo. Por exemplo, Maiakovski, poeta russo do início do século XX, escreveu:
 
"Na primeira noite, eles aproximam-se
e colhem uma flor de nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite,
já não se escondem,
pisam as flores, matam nosso cão.
E na oportunidade
E não dizemos nada.
Até que um dia, o mais frágil deles,
entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua,
e, conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E porque não dissemos nada,
já não podemos dizer nada".
Maiakovski (1893-1930
 
 
Bertold Brecht escreveu:

"Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro
Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário
Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável
Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho meu emprego
Também não me importei
Agora estão a levar-me

Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo".
Bertold Brecht (1898-1956)
 
Em 1933 Martin Niemöller (símbolo da resistência ao nazismo) fez o seguinte poema:
 
"Um dia vieram e levaram meu vizinho que era judeu.
Como não sou judeu, não me incomodei.
No dia seguinte, vieram e levaram
meu outro vizinho que era comunista.
Como não sou comunista, não me incomodei .
No terceiro dia vieram e levaram meu vizinho católico.
Como não sou católico, não me incomodei.
No quarto dia, vieram e me levaram;
já não havia mais ninguém para reclamar?"
Martin Niemöller (1892-1984?)
 
Em 2007 Cláudio Humberto presenteou-nos assim:
"Primeiro eles roubaram-nos os sinais, mas não fui eu a vítima,
Depois incendiaram os autocarros, mas eu não estava neles;
Depois fecharam ruas, onde não moro;
Fecharam então o portão da favela, que não habito;
Em seguida arrastaram até à morte uma criança: mas não era o meu filho?"
Cláudio Humberto, em 09 Fevereiro de 2007
 
 
Também Martin Luther King (1929-1968) disse um dia:
"O que mais me preocupa não é nem o grito dos violentos, dos corruptos, dos desonestos, dos sem carácter, dos sem ética. 
- O que mais me preocupa é o silêncio dos bons". 
 

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

O verdadeiro medo de existir...

 
Quando em Setembro de 2004 o filósofo José Gil escrevia as últimas linhas de um livrinho que muito vendeu sob o título "Portugal, Hoje. O Medo de Existir", ainda a procissão estava no adro. Eram ainda queixumes vagos e de barriga cheia, mais de índole filosófica, sobre um "medo de existir" genérico e difuso, por parte dos portugueses. Tratava-se de um tentame de análise da mentalidade tuga, ao longo dos tempos, sobretudo desde os tempos do Estado Novo, culminando no período em que o livro foi escrito, o breve "reinado" de Santana Lopes, que exageradamente o autor empolou muito mais do que a importância que lhe era devida. De permeio o período do que chamamos "o Grande Regabofe", que principia no "Enriqueci!" cavaquista (a expressão é de José Gil). Este interlúdio de aparente enriquecimento sem sustentação, relacionado com a última pataqueira - a dos dinheiros comunitários- gerou uma perplexidade a par de um certo deslumbramento, pelo que não se percebe muito bem onde andava então o medo. No capítulo intitulado  "De que é que se tem medo?", as respostasm não são bem claras. Parece que radica num medo atávico, ao Poder, um ingénuo "medo de não saber e de ser desmascarado", um "medo de ter medo", "medo de parecer ter medo, de parecer fraco, incapaz, ignorante, medíocre" (p. 80). Em última instância, era o velho medo de "falar", de "dizer" - a falta de liberdade de expressão, como se explana no capítulo sobre "O trauma português e o clima actual [2004]": "Mas tratar-se-á realmente de terror, ou mesmo de micro-terror, o que se passa na realidade actual da sociedade portuguesa?" - para depois glosar um caso que hoje já ninguém lembra, de umas certas pressões políticas sobre um canal privado de televisão por causa de umas diatribes do comentarista Marcelo Rebelo de Sousa, o que o levaram a demitir-se do cargo. Depois disso já houve as pressões de Sócrates sobre jornalistas, de Relvas idem, aspas, aspas... - sem que isso tirasse, de facto, o sono aos portugueses.
 
Vale a pena reler o livro, sobretudo para se perceber a trajectória que a Tugalândia tomou, até ao Medo a sério, o Terror a sério, em que vivemos. Este é bem menos prosaico e teórico. É real. É o medo de se perder o emprego, de se morrer à fome. É o medo de se ser assaltado, roubado e agredido. É o medo do idoso poder ser despejado do Lar que a reforma já não dá para pagar e que os filhos também não podem (ou não querem) pagar. É o medo de não se ter dinheiro para acabar o curso. É o medo de perder a casa e poder ter de ir de domir para a rua, sob uns cartões. É o medo que o desespero possa levar à loucura e ao suicídio.
 
Vale ainda a pena reler o livro, por alguns diagnósticos, ou melhor, constatações, que estão na raiz do problema, como por exemplo este parágrafo da pág. 72:
"A entrada de Portugal na União Europeia - de dentro para fora - processa-se, pois, através de mil ambiguidades. No meio da grande perturbação actual [2004] que a destruição do país arcaico provoca, agarramo-nos a automatismos afectivos, à tentação da corrupção (esperteza) por velhos hábitos de impunidade de classe, à inércia, ao compadrio (vestígios degenerados da antiga democracia afectiva), enfim não já ao familiarismo, que explodiu como meio envolvente, mas à família desfeita ainda pertinente como ideal imaginário que se remenda todos os dias com a ajuda de psiquiatras, psicólogos, psicanalistas" [isto era naquela altura, pois hoje já não há dinheiro para estes luxos de idas a psi's].
 
- Em suma, o que o autor não diz, mas nós intuímos, a diferença dramática desta Crise relativamente às crises do passado é que perdemos a rectaguarda que era a Aldeia, a real e a metafórica: da aldeia vinham as batatas, a hortaliça, o azeite, o queijinho e o salpicão, quando havia dificuldades na urbe. Só que agora os velhotes morreram ou estão no Lar de Terceira Idade, entrevados, e essa rectaguarda acabou. Como acabou a rectaguarda desse apoio afectivo, a Família.  E, perante o choque, desaprendida a agricultura e esquecidos os caminhos da Aldeia, estamos sós, órfãos e indefesos, perante uma besta-fera avassaladora que a cada momento nos pode devorar e a outros já devorou. Afinal, concluímos, eram de papel os sonhos e as promessas da mítica Europa e da aldeia global, perdemo-nos no virtual, deixámos a terra, perdemos o chão e ficámos sem nada.
Será ainda possível reaprender os caminhos da Aldeia real, a que tinha cheiros e aromas (do fumo da lareira, do estrume, das estevas e das urzes)? - E será que, depois, as troikas, os FMI's e Bróxelas, nos permitem plantar uma couve ou criar uma pita e um reco sem nos espremerem com impostos e com ASAE's??
 
Ti Zé da Aldeia

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

DIZ QUE.... há alternativas para os cortes, sem lixar sempre os do costume!...

«DIZ QUE...»
- É esta uma expressão muito aldeã, quando se pretendia reproduzir o que por aí se dizia (sobretudo mexericos), mas vincando que não era da lavra do emissor, a pessoa ela própria. Assim o faremos quando aqui postarmos algumas coisas que, não sendo de nossa lavra, fomos pescar à "net" (dessas coisas que se repassam por mail, ou então retiradas da blogosfera, devidamente citadas, se se conhecer o autor).
Do texto que se segue não conhecemos autor, mas suspeitamos que seja do Manuelinho de Évora. Se não fôr, ele que se queixe. Aqui fica à mesma, realçando que não chegámos a fazer as contas que aqui se apresentam, mas que acreditamos que estejam certas (o Manuelinho, apesar de meio tolo, era bom aluno a matemática):

Querem melhor receita para sobrevivermos a 2013 ?!...

PROPOSTAS DE ALTERNATIVA à austeridade, que tudo está a mirrar, isto no que toca a CORTE DE DESPESA nas ditas gorduras.

Por isso:
- Reduzam 50% do Orçamento da Assembleia da República e vão poupar +- 43.000.000,00€
- Reduzam 50% do Orçamento da Presidência da República e vão poupar +- 7.600.000,00€
- Cortem as Subvenções Vitalícias aos Políticos deputados e vão poupar +- 8.000.000,00€
- Cortem 30% nos vencimentos e outras mordomias dos políticos, seus assessores, secretários e companhia e vão poupar +- 2.000.000.00€
- Cortem 50% das subvenções estatais aos partidos políticos e pouparão +- 40.000.000,00€.
- Cortem, com rigor, os apoios às Fundações e bem assim os benefícios fiscais às mesmas e irão poupar +- 500.000.000,00€.
- Reduzam, em média, 1,5 Vereador por cada Câmara e irão poupar +- 13.000.000,00€
- Renegociem, a sério, as famosas Parcerias Público Privadas e as Rendas Energéticas e pouparão + 1.500.000.000,00€.

Só aqui nestas “coisitas”, o país reduz a despesa em mais de 2 MIL e CEM MILHÕES de Euros.

Mas nas receitas também se pode melhorar e muito a sua cobrança.

- Combatam eficazmente a tão desenvolvida ECONOMIA PARALELA e as Receitas aumentarão mais de 10.000.000.000,00€
- Procurem e realizem o dinheiro que foi metido no BPN e encontrarão mais de 9.000.000.000,00€
- Vendam 200 das tais 238 viaturas de luxo do parque do Estado e as receitas aumentarão +- 5.000.000,00€
- Façam o mesmo a 308 automóveis das Câmaras, 1 por cada uma, e as receitas aumentarão +- 3.000.000,00€.
- Fundam a CP com a Refer e outras empresas do grupo e ainda com a Soflusa e pouparão em Administrações +- 7.000.000,00€

Nestas “coisitas” as receitas aumentarão cerca de VINTE MIL MILHÕES DE EUROS, sendo certo que não se fazem contas à redução das despesas com combustíveis, telemóveis e outras mordomias, por força da venda das viaturas, valores esses que não são desprezíveis.
Sendo assim, é ou não possível, reduzir o défice, reduzir a dívida pública, injetar liquidez na economia, para que o país volte a funcionar?

Há, ou não HÁ, alternativas?

Ainda sobre a nova "Solução Final" - acontece na Grécia, e não tardará aqui...

A propósito do post sobre a "Solução final" para a Função Pública, um nosso visitante fez-nos chegar este recorte, recentemente saído no Jornal de Aveiro (2013.01.07), pela pena de António Rocha. É mais um aviso sobre o novo nazismo ultra-neoliberal - já está a acontecer na Grécia, e, como ali se antecipa o que depois aqui acontece, preparemo-nos... Aqui fica:
 
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Se os caracteres não forem bem legíveis (trata-se de fotocópia digitalizada), pode ver aqui:

domingo, 20 de janeiro de 2013

AFINAL SEMPRE EXISTEM…

Conheci ontem um. Foi-me apresentado. Fazia 30 anos. Rapazito aparentemente de origem humilde, de lugar próximo cá da aldeia. A conversa recaiu nos dias que correm e nos males que nos atingem. Política, ou politiquice. Comunistas?, ai cruzes, abrenúncio! Os tempos que correm são consequência do “Grande Regabofe” – expressão minha, imodéstia aparte, mas traduzindo o que ele queria dizer, referindo-se aos tempos do crédito fácil e do passo maior que a perna. Os conceitos que tinha pareciam ter sido todos bebidos nos lugares-comuns da cassete neo-liberal caseira, injectada pela maioria somada PSD/CDS que se (nos)governa. A culpa era toda do desvario das pessoas que tinham gasto mais do que deviam, que deu nisto, que tínhamos de pagar, pelo que era preciso cortar, cortar!... Cortar no Estado, no Estado Social, pois claro, funcionários públicos, grandes parasitas. Contra-argumentei com o serviço público prestado às pessoas e à vantagem se desfrutar de serviços sem o acréscimo de mais-valias. Que nada!, a privada é que era, e que resolvia tudo muito melhor e mais barato. Pensões aos idosos? Num extremo de argumentação, o rapaz dá o exemplo da própria mãe, que nunca descontou para a segurança social e que até estava a beneficiar da reforma, tal como muita gente que não descontou e tinha igual benesse. Para o dito cujo, só quem descontou (ou pagou para um seguro de reforma) é que devia receber. Daqui se depreende que aos velhinhos que nunca descontaram para a Caixa, era dar-se-lhes uma injecção atrás da orelha quando chegassem à idade da “improdutividade” e do peso-morto, como se dizia, noutros tempos, que os tais comunistas iriam fazer quando chegassem ao poder.

Quis saber mais sobre o jovem. Que fazia? Era, estava-se a ver, um “jovem empresário”, certamente de elevado potencial. Vim a saber que do sector agro-pecuário e, disseram-me, bastante trabalhador (e eu a pensar que era um yuppie serôdio do séc. XXI). Não chegara a concluir o 12º ano, metera um projecto agrícola e vivia da terra e das ovelhas, lá na aldeia. Nessa zona não há grandes quintas, nem o rapaz era filho de grandes agrários (ao que julgo saber).

Constituía grande mistério para mim como é que num país pobre e a caminhar para miséria maior, partidos de direita neoliberal ganhavam eleições e, somando votos, chegavam até a maiorias governativas. No que toca à Tugalândia, tendo em conta sobretudo o resultado das últimas eleições, julgava eu que tal só se explicava pelo descontentamento relativamente às políticas restritivas ditadas pela conjuntura da grande crise internacional e por cá iniciadas pelo partido esquerdo do Centrão. Porque, aplicando-se o princípio da circunstância de Ortega y Gasset (“eu sou eu e a minha circunstância”), ser-se pobre e miserável não se coaduna com “opções de classe” (no jargão marxista) por partidos que representam os grandes interesses económicos. Desde as lutas sociais da Roma Antiga (de que ficaram registos escritos) se sabe que é assim. Bem, é claro que a Propaganda consegue ludibriar muita e boa gente, mas…

Continuando a perfilhar desta teoria da correlação entre situação/condição social e opção política, a verdade é que, afinal, sempre há gente que, ludibriada por uma condição social aparente (“sou empresário”) engrena nas doutrinas hiper-neoliberais de uma cassete que lhes foi impingida por um PREC ao contrário (como disse Pacheco Pereira no artigo anteriormente aqui postado). Faltou-me perguntar ao tal jovem “empresário agrícola” (dantes dizia-se “lavrador”, mas agora “empresário agrícola” soa melhor), dizia, que me faltou perguntar-lhe se recebeu algum apoio do IFADAP, IAPMEI, ou de programas comunitários (LEADER, PRODER, etc.) para o seu investimento. É evidente que eu, parasita social (porque funcionário público) até sou favorável a esse tipo de apoios, para fomento da produção. Mas, quem repete a cassete neoliberal anti-Estado social, em consciência, deveria rejeitar qualquer apoio desse tipo. Não contestamos, obviamente, esse estímulo gerador de “retorno” económico, por parte do Estado (estrutura representativa de todos nós, que tem também por missão potenciar o desenvolvimento económico, o que mais justifica a sua existência e não o seu aniquilamento, como parecem visar os teóricos neoliberais). Mas, para além dessa função, o Estado tem outras que aos privados não interessam, porque não geram o tal “retorno” financeiro desejado, como sejam, por exemplo, a da Cultura “latu sensu”, ou a promoção da prática desportiva (que não o desporto de massas que consegue ser auto-sustentável e constitui grande negócio, como se sabe), para não falar nas funções sociais de assistência, como sejam a saúde ou a protecção social de pessoas que trabalharam toda uma vida e, no final, não são lixo, ou inúteis a abater. E para não falar, também, na igualdade de oportunidades na Educação, pois de outro modo só os filhos dos grandes senhores (com dinheiro para altos colégios)poderão continuar a replicar o seu estatuto de casta dominante, bloqueando toda e qualquer possibilidade de igualdade social e de escolha dos melhores, por mérito e não por mais possibilidades económicas e privilégio de casta.
O pecado capital do Capitalismo é a promoção de um anti-valor, a Competição, com total desprezo pelos valores da Solidariedade humana, que, no limite, procurará substituir pela caridadezinha. Assim, o Capitalismo, é o resultado económico-social e político da afirmação do gene predador e do instinto mais primário que vem ainda das fases primevas da savana africana. É a doutrina do “homo homini lupus” de que falavam os teóricos socialistas do século XIX. Podemos dizer que o primeiro indício de humanidade ocorre no momento luminoso em que o primeiro antepassado partilhou o seu alimento com o seu semelhante, o confortou e o ajudou no seu sofrimento, rompendo com o individualismo natural e animalesco da competição ou do egoísmo.

O Humanismo evoluiu depois para além da materialidade do alimento e das coisas, e alçou-se no sentido de uma evolução espiritual, superando a mera “techné”. A Civilização é o somatório de tudo isso, da matéria e de espírito, e surge como corolário de um processo que teve no centro, para bem e para mal, o Estado, que é o poder organizado em função dos governados e elemento coordenador das sociedades humanas. E o Estado sempre existiu desde o Egipto faraónico passando por toda a Antiguidade oriental e clássica, reinos medievais ou repúblicas contemporâneas. Ora, desmantelar uma tal estrutura, em nome de uma "modernidade" económica de resultado duvidoso, arrastará necessariamente a uma regressão civilizacional. Parece ser o que pretende esta “Revolução” neoliberal, sob a batuta de criaturas sem nome e sem rosto, que se escondem atrás dos deuses Mercados, e encontra agentes servis nos partidos do Sistema. A partir de onde, a coberto de crises provocadas, debitam a sua cassete que chega até a encontrar eco junto de incautos adeptos aqui ao nível da aldeia real/local que nós conhecemos. Ontem conheci um desses, fazendo-me lembrar os incautos de outros tempos – que, pelos vistos, as cassetes não são exclusivas de um dado lado.

M. Giesta

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

"A Servidão Moderna" - se calhar o problema está no Sistema...

Ao ler o texto de Pacheco Pereira aqui postado, ocorre-me pensara que o nosso problema "caseiro" seja apenas uma peça de um problema mais vasto, que radica na Crise mais global do Ocidente, construído na base do Ter e lucro inerente. O eminente historiador inglês Arnold Toynbee denunciou-o há muitos anos, afirmando que a civilização ocidental de matriz capitalista era autofágica.
Nós por cá, depois do período eufórico do "Grande Regabofe" iniciado com a entrada na CEE e que teve o auge nos anos 90, entrámos na ressaca após a entrada no novo século e novo milénio. Alguém nos drogou e viciou, e agora está na hora de pagar a factura...
Pensando em tudo isso, ocorreu-me um impressionante documentário produzido por Jean-François Brient, intitulado "A Servidão Moderna". O texto foi escrito em 2007 e o documentário saíu em 2009. Trata-se de uma crítica implacável à "sociedade de consumo" e ao sistema de produção que lhe está na base. Entre vários textos aqui evocados, há um excerto do Evangelho de S. Marcos, em que se pergunta: "Que aproveita ao Homem ganhar o mundo todo se perder a sua alma?"....
Aqui fica um excerto:
[clicar 2 vezes sobre a imagem, para expandir o écran]
 
Se pretender ver todo o documentário desde o início (são 52minutos, mas vale a pena), clicar sobre este link: http://www.youtube.com/watch?v=B7hSxm67izU
 

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

"O peixe apodrece pela cabeça" - um artigo fundamental de Pacheco Pereira

Mão amiga fez-nos chegar um recorte do "Público" do passado sábado (2013.01.12) respeitante a um artigo de autoria de José Pacheco Pereira, onde se faz uma radiografia político-social de uma precisão e de uma clarividência como não vimos ainda. Não espanta, pela inteligência e argúcia do autor, senhor de uma cultura vastíssima e conhecedor dos por-dentros do sistema até ao tutano, pela sua acção e análise política desde antes do 25 de Abril. O que não deixa de ser curiosa é a expressão de "PREC (Processo Revolucionário Em Curso) ao contrário", ou seja, agora de matriz hiper-neoliberal, associação de ideias que já aqui se fez há dias, num outro post deste blogue (por Manuel Giesta - http://aquidaldeia.blogspot.pt/2013/01/o-8-e-o-80-um-artigo-profetico-de-1993.html). E conclui Pacheco Pereira que "... a sociedade que este PREC está a gerar é destrutiva, paroquial, subserviente, sem oportunidades para os bons e cheia de oportunidades para os maus..."
Mas há que ler tudo, pelo que aqui fica:

«O peixe apodrece pela cabeça
O vírus da intriga e da divisão sempre foi a melhor garantia da intangibilidade do poder

Nós não vivemos no melhor dos mundos. Longe disso, em todos os países europeus, fora dos Balcãs e do Leste, vive-se melhor. Não vivemos também no pior dos mundos. Longe disso, em África, na Ásia, Américas do Centro e Sul e Oceânia, vive-se muito pior. Mas não podemos contentar-nos com este equilíbrio estatístico, porque não são os números absolutos que são relevantes, mas sim os relativos. Não é o que há, é o que está a mudar. O “processo revolucionário em curso” (PREC) ao contrário, que atravessamos, é um processo dinâmico, move-se, desenvolve-se num determinado sentido, alastra pelas suas margens como uma nódoa, destrói todos os dias alguma coisa. E o seu sentido é afastar-nos do melhor dos mundos e aproximar-nos do pior.
A grande incapacidade do Governo, que não é involuntária, mas voluntária, desejada, programática, é ignorar que nestes dias não é tanto a pobreza e a miséria que são características dos tempos que vivemos, mas sim o empobrecimento. O empobrecimento é um factor dinâmico muito mais importante do que a pobreza em termos de efeitos sociais e da perversidade de resultados. É evidente que o principal resultado do empobrecimento é aumentar a pobreza, mas pelo caminho destrói a fibra da sociedade, mergulha-a na apatia e na revolta, dois lados da mesma coisa, corroí-lhe o tónus moral, e faz aumentar todos os sentimentos mesquinhos.
Eu não cuido da moral individual, essa tarefa é para os moralistas e para as religiões, mas preocupa-me a moral colectiva, os sentimentos colectivos, a qualidade moral mínima de Portugal e dos portugueses, minha pátria e minha gente. Contrariamente ao que se diz, não é o “melhor de nós” que vem ao de cima com a crise, mas sim o pior de nós. Estamos a ajudar a criar uma sociedade maldosa, profundamente dividida, oscilando entre rancores e egoísmos, afectada mais do que nunca pelos efeitos desse velho provérbio de pescadores que diz que o peixe apodrece pela cabeça. E esses estragos não se apagam facilmente.
Todo o discurso público do poder é o da divisão e o apelo à luta de classes, grupos, idades, profissões, cada um contra o outro, mesmo quando a condição de cada um é a mesma do outro. Os que tinham toda a razão para fazer greve voltam-se contra os que fazem greve. Os jovens são instigados a voltarem-se contra os velhos, pensionistas e reformados. Os que têm alguns meios de vida desdenham dos que recebem subsídios de desemprego. Os que ainda não viram a sua profissão como alvo apontam a do outro como o alvo que deveria ser o seguinte. Polícias olham para os militares, os militares para os polícias. Trabalhadores do sector privado culpam os funcionários públicos, os funcionários públicos fecham-se com medo do desemprego. Os que ganham 900 euros apontam o dedo aos que ganham 1000 euros. Uma inveja social mesquinha e corrosiva perpassa tudo e todos e cada um defende o seu território, dando razão ao Governo, que aponta toda a contestação como sendo “corporativa”. Só a minha “corporação” é que não é corporativa, todas as outras são-no. O vírus da intriga e da divisão sempre foi a melhor garantia da intangibilidade do poder. E não é difícil em tempos de crise propagar estas epidemias, mas é perigoso. Porém, o medo ajuda, ajuda muito.
Antes dizia-se que o anti-semitismo era o socialismo dos imbecis, agora os nossos governantes apostam numa fractura social que faz de cada uma das partes imbecis sociais, e que, pela sua linguagem, divisões, alvos, egoísmos, servem de rebanho aos pastores deste “PREC”. A única fractura que não desejam é entre os incluídos e os excluídos, os que estão a ganhar com esta crise – poucos, mas a ganhar muito, o suficiente para o preço do Copacabana Palace ser peanuts – e os muitos que estão a perder, porque sabem que ela é socialmente perigosa. Subversiva é o termo certo. Fora disso, venha a luta de classes dos imbecis.
Os maus costumes de uma sociedade em crise, permeável a partir de cima pelos miasmas que dividem e pelo medo, estão a fazer um Portugal pior, muito pior. A mentira tornou-se uma prática quotidiana da governação. Foi-o já em doses exponenciais no Governo socrático, continua no governo passista-relvista. Todos os dias há uma nova tentativa de engano, uma manipulação, uma inquinação do espaço público, uma espertice qualquer vinda de um gabinete ou de uma agência, canhestras muitas vezes, mas sempre destinadas a enganar-nos.
Todo este processo da “refundação do Estado”, desde o anúncio patético e atabalhoado de uma “refundação do memorando” até à encenação da fuga do relatório do FMI, seguida da tentativa de controlo dos danos feita por Moedas, seguida de todos os enganos sobre a sua preparação, versões, papel do Governo, destino e intenções, é o exemplo de como a mentira se tornou a essência do discurso do poder.
Querem, o Governo e a maioria, convencer-nos seriamente de que vão “refundar” o Estado a partir de um anúncio de um corte de 4 mil milhões, escondendo-nos os compromissos já tomados sobre esse valor antes de qualquer discussão, seguido da encomenda de um relatório do FMI conhecido por uma fuga de informação de um comentador, preparado pelo Governo em peso escondido por detrás da instituição internacional, depois de novo passado aos jornais numa “versão preliminar” para preparar a opinião público do susto da definitiva, e depois, a um mês do prazo para a apresentação das propostas do Governo à troika, se apelar ao debate público organizando uma conferência de um dia com convidados escolhidos a dedo entre os próceres do “PREC” e os oposicionistas bem-comportados, juntamente com uma comissão parlamentar de fachada para pressionar o PS, tudo isto sem nunca se saber qual é a proposta do Governo que deveria estar na origem de todo o debate?
Quem colaborar com este processo está a colaborar numa mentira, a ajudar a esconder que tudo já foi acordado, e se alguma das coisas que já foram acordadas com a troika não avançar, é pelo receio dos seus efeitos eleitorais. Como é que nos podemos surpreender por os “de baixo” – os novos inimigos do Governo, restaurantes, cabeleireiros e oficinas de reparação de automóveis – fugirem ao fisco, se os “de cima” fogem à verdade? Tudo o resto é nevoeiro.
A grande falácia deste “PREC” é pensar que a sociedade, a economia e as empresas podem de repente, feito o “ajustamento”, iniciar um arranque glorioso para o crescimento económico e para a melhoria social, quando o que o empobrecimento faz à sociedade é retirar-lhe todo o potencial criativo e força anímica para qualquer reacção que não seja a sobrevivência egoísta e nalguns casos a exploração abusiva da situação em termos próprios. A morte da “classe média”, de que CDS e PSD eram no passado os grandes arautos, é a receita melhor para destruir qualquer dinamismo, retirar à sociedade qualquer potencial de crescimento. Podem fazer mil programas de televisão sobre o “pensamento positivo”, sobre o “Portugal melhor”, premiar em cerimónias televisivas os jovens “empreendedores”, “inovadores”, “inventivos”, que estão apenas a alimentar a ilusão de que qualquer dessas qualidades pode sobreviver numa sociedade que está a ser construída para que eles emigrem se querem ter sucesso, ou vão à falência debaixo do jugo dos impostos e da crise.
Seria, aliás, muito educativo revisitar muitas das iniciativas apresentadas com parangonas televisivas como de “sucesso” e de “futuro” em 2010, 2011, 2012 e ver onde é que elas estão em princípio de 2013. Não estão em lado nenhum porque a sociedade que este “PREC” está a gerar é destrutiva, paroquial, subserviente, sem oportunidades para os bons e cheias de oportunidades para os maus, que as percebem à distância. Parece maniqueísmo? Antes fosse. Mas a responsabilidade é nossa. Edmund Burke escreveu-o: “Tudo o que é necessário para o triunfo do mal é que os homens bons não façam nada”. Sempre podem cortar a cabeça ao peixe, deitar o peixe fora e arranjar outro. É difícil, mas não é impossível.»
José Pacheco Pereira – “Público” 12 janeiro 2012

Nota Cá d’Aldeia: e porque o cidadão comum ( teso como um carapau) deixou de poder aceder à página Web do “Público” (agora só a pagantes), agradecemos esta transcrição ao site do Clube dos Jornalistas: http://www.clubedejornalistas.pt/?p=7486